Hoje eu sei que aquela imprevisivel troca de olhares não tinha sido obra do acaso. O destino, na sua inquestionavel sabedoria, decidiu cruzar as nossas vidas e dar-me uma lição. Assim, simplesmente, através de um olhar. Jamais esquecerei aqueles olhos. Era inevitável! tinha de voltar a vê-la. Havia uma misteriosa força que me empurrava para aquela mulher. Eu tinha de voltar a encontrá-la. Ela era a tal! A minha Princesa das Botas Pesadas.
Eu nem o nome dela sabia. Eu dela nada sabia. Mas a Princesa das Botas Pesadas era sem dúvida a mulher da minha vida. E eu tinha-a perdido antes mesmo de a ter conhecido. Eu tinha direito a uma nova oportunidade. Eu merecia uma nova oportunidade. O intimo desejo de a voltar a ver, de a poder tocar, olha-la nos olhos e poder dizer amo-te, rapidamente se tornou numa obsessão doentia. Nos dias que se seguiram, à hora do entardecer, quem quisesse falar comigo sabia onde me encontrar. Passava horas a vaguear pelas ruas do Bairro do Amor, percorrendo as ruas onde a vi pela primeira vez.
Incansável. Os meus passos conduziam-me a ruas estreitas e inclinadas que aprendi a conhecer como as minhas proprias mãos. Muitas foram as vezes que, imovel e de olhar vago, me sentava em frente da fachada daquela pensão. Alturas houve em que quase acreditei que ela lá estava, linda e a sorrir para mim. Aqueles olhos. Eu vi inumeras vezes aqueles olhos verdes. Apesar da minha dedicação e da intensa procura, da minha Princesa das Botas Pesadas, nem sinal!
Com o passar dos dias, uma nova sensação invadira a minha alma. Embora não conseguisse compreender onde se situava, se na cabeça se no coração, um enorme vazio apoderou-se de mim. Angustia. Passou-se uma semana, duas, um mês e da minha lindinha nada! Sentia-me só. Triste. Quando pensava nela vinham os suores frios e o meu coração palpitava com mais força. Havia um aperto. Uma vontade de soltar gritos. Silencios infinitos. Paixão. Pela primeira vez na minha vida, senti que estava apaixonado, e o pior é que doía. Doia muito. Não era nada como eu havia imaginado e tinha lido nos livros da estante lá de casa. Afinal, o AMOR - ao contrario do que nos fazem acreditar - não é uma coisa boa.
(E é muito pior quando se ama sozinho...!)
(MC-1996)